24 janeiro, 2011

A vida é simples

A vida é simples. Primeiro se nasce. Para isso, é necessário, antes, que um casal copule ou uma mulher faça uma inseminação artificial, que haja uma gestação, que haja um acompanhamento periódico do processo germinativo, que se compre fraldas, roupas, e se faça um chá de bebê, que, no momento do parto, haja um bom obstetra e boas ferramentas, todas esterilizadas, ou força na vagina e no períneo, muita força, para, após alguns cortes ou alguns empurrões, ver a luz do mundo. Ou melhor, a da luminária do centro cirúrgico.
Depois se cresce. Crescer é importante. Os ossos e músculos e todo o corpo, num movimento inconstante, principalmente durante a adolescência, vão se desenvolvendo. Dói, às vezes. O cérebro pode ou não acompanhar essa fase de expansão; é preferível e aconselhável que acompanhe. Surgem os relacionamentos, as amizades, as intrigas, os estudos, as dúvidas, o primeiro emprego, a primeira demissão, o segundo emprego, a segunda demissão, o desemprego constante, a fome, a ressurreição, a nova demissão, o casamento, as brigas entre recém-casados, os filhos, a separação, o segundo casamento, a mulher do primeiro casamento pedindo pensão aos filhos, as dívidas, a crise da meia idade, as rugas, a bengala, o Parkinson, os escorregões no azulejo do banheiro, a clavícula quebrada, uma cirurgia para consertar os ossos, uma cirurgia para consertar as artérias, uma cirurgia para consertar o ego, os resfriados que não vão embora, os dias de indisposição, as horas intermináveis sob o cobertor, as visitas dos familiares (que parecem dar um último aperto de mão antes de se preocuparem com a herança que lhes cabe), o sono eterno.
Depois basta morrer. Morrer é certo, apesar de não nos parecer. O corpo desce ao solo e aduba o cemitério, para que cresça mato na terra. O morto é velado, enterrado, chorado e rezado. Vive por até uma semana na memória dos mais afastados e por anos na cabeça da viúva, até que ela encontre alguém que satisfaça seu ventre fúnebre. Eis, então, o eterno descanso de que tanto se fala: ninguém mais falando sobre você.
Simples a vida, não?

3 comentários:

  1. Gostei pra caramba do texto, divertido.

    Um abraço,

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  2. nossa, com voce as definiçoes da vida ficam muito mais simples..
    voce é foda e eu te amo! simples assim *-*

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